quinta-feira, 21 de julho de 2011

~ Entendendo a Amizade ~


O ilustre romano Cícero, em seus célebres ensaios literários sobre a amizade, registrou a seguinte pergunta: ‘Haverá alguma coisa mais doce do que teres alguém com quem possas falar de todas as tuas coisas, como se falasses contigo mesmo?’

Realmente, não há solidão pior do que a do homem sem amigos. A falta de amizade faz com que seu mundo de afetividade se transforme em enorme ‘deserto interior’.

Entre amigos não existe nenhum limite às confidências, pois a virtude principal que os une é a sinceridade. Para que tenhamos maior compreensão sobre a amizade, é necessário analisarmos as profundezas da intimidade humana.

‘A Natureza deu ao homem a necessidade de amar e de ser amado. Um dos maiores prazeres que lhe são concedidos na Terra é o de encontrar corações que com o seu simpatizem.’ Portanto, a criatura não deve ‘endurecer o coração e fechá-lo à sensibilidade’ se receber ingratidão de seus amigos.

De certo modo, temos a crença de que amigos leais são somente os que compartilham os mesmos gostos, tendências, entusiasmos e idéias; que devem estar sempre à nossa disposição, concordar com tudo o que pensamos e de que precisamos e que jamais devem ter sentimentos contraditórios.

Se realmente alimentarmos essa crença de que os amigos verdadeiros são aqueles que se modelam ao nosso perfeito ‘idealismo mítico’; isto é, relacionamentos estruturados em ‘castelos no ar’, poderemos estar vivendo, fundamentalmente, sob uma consistência irreal a respeito da amizade.

O crescimento de nossas relações com os semelhantes depende da nossa habilidade em não ultrapassar as possibilidades limitativas de cada um e de obtermos uma compreensão das restrições da liberdade e disponibilidade dos amigos, ficando quase sempre atentos às conexões que fazemos com nossos devaneios emocionais.

De modo geral, não admitimos que podem coexistir entre amigos sentimentos ambivalentes como: admiração e inveja, estima e competição, afeição e orgulho. As emoções radicalmente diferentes, ou mesmo opostas, são inatas nas criaturas humanas no estágio evolutivo em que se encontram.

Muitos tiveram uma educação fantasiosa do tipo ‘e viveram felizes para sempre’ e, quando se deparam com a realidade humana, ficam profundamente chocados por constatar que possuem ambivalência de sentimentos, identificando-os também nas figuras mais importantes de sua vida.

Há amigos de ‘atividades habituais’: possuem uma convivência restrita, reúnem-se somente em dias de lazer e de esportes, nas horas de trabalho, ou em cursos ou eventos diversos. Outros existem, qualificados como amigos , por ‘vantagens recíprocas’. São unidos pelas profissões que exercem, promovem sociedades de interesse comum e com metas especiais, desempenhando papéis e ofícios especializados juntos; mas não juntos interiormente.

Os denominados amigos de ‘décadas diferentes’ são todos aqueles ligados por enormes afinidades, adquirem uma intimidade carinhosa e verdadeira, que enseja a permuta de experiências, de vigor e de ânimo. Outra categoria a ser considerada é a dos chamados amigos ‘itinerantes’ ou ‘transitórios’. Cruzam nossas vidas durante determinada etapa. Compartilham nossa amizade em épocas cruciais; outras vezes, em busca de aprendizagem, passam por nós nas encruzilhadas do caminho, para depois se desligarem, porque se desvaneceram os elos comuns que os mantinham conosco. No decorrer do tempo, cada um deles segue o caminho que traçou rumo ao próprio destino.

Os reconhecidos, porém, como amigos ‘íntimos’ ou ‘permanentes’ são aqueles que possuem afeto mútuo e o conservam indefinidamente. A intimidade entre eles faz com que tenham um crescente amadurecimento espiritual. Alargam seu mundo interior à medida que aumentam a capacidade de compreender as similaridades e as diferenças entre si mesmos.

Em verdade, para se possuir real intimidade e adquirir plena confiança entre amigos é necessário nunca esconder o que há de desagradável em nós; em outras palavras, é preciso revelar nossa falibilidade. Querer demonstrar caráter impecável e isenção de dúvidas é característica de indivíduos incapazes de perdoar e inábeis para manter relações duradouras e afetividade verdadeira.

‘Não abandones um velho amigo, visto que o novo não é igual a ele. Vinho novo, amigo novo; deixa-o envelhecer, e beberás com prazer.’

(Texto extraído do livro As Dores da Alma, de Francisco do Espírito Santo Neto, ditado por Hammed)

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